Cuidados de Fisioterapia na Terceira Idade: Reabilitar, Prevenir e Viver com Dignidade
Envelhecer é uma realidade inevitável mas envelhecer bem é uma escolha que exige cuidado, planeamento e apoio profissional. Entre as várias dimensões do envelhecimento ativo, a fisioterapia assume um papel central na preservação da mobilidade, prevenção de quedas, reabilitação pós-doença e promoção da autonomia dos idosos.
Em Portugal, onde mais de 23% da população tem mais de 65 anos (dados do INE, 2023), os cuidados de fisioterapia representam não apenas um serviço de saúde, mas uma ferramenta essencial de qualidade de vida.
O papel da fisioterapia no envelhecimento ativo
A fisioterapia é muitas vezes associada à reabilitação após lesões ou cirurgias. No entanto, no contexto da terceira idade, a sua função vai muito além disso.
O fisioterapeuta é um agente de prevenção. Através de programas personalizados, ajuda o idoso a manter força muscular, equilíbrio e flexibilidade três pilares fundamentais para evitar quedas, uma das principais causas de incapacidade e mortalidade entre idosos em Portugal.
Segundo dados da Direção-Geral da Saúde (DGS), cerca de 30% dos idosos com mais de 65 anos sofrem pelo menos uma queda por ano, e muitas dessas quedas resultam em fraturas graves, como a do colo do fémur.
Prevenir é cuidar
Os programas de fisioterapia preventiva realizados em centros de dia, lares ou no domicílio — incluem exercícios simples, adaptados à idade e à condição física. Movimentos de equilíbrio, treino de marcha e exercícios respiratórios são exemplos de práticas que reduzem o risco de quedas e melhoram a autoconfiança.
“Um idoso ativo é um idoso mais independente, menos medicado e com melhor saúde mental”, sublinha a Associação Portuguesa de Fisioterapeutas (APF).
Fisioterapia domiciliária: conforto e continuidade dos cuidados
Com o aumento da população envelhecida e a dificuldade de deslocação de muitos idosos, a fisioterapia ao domicílio tornou-se um serviço cada vez mais procurado.
O fisioterapeuta desloca-se à residência, avalia as condições do ambiente e adapta o plano de tratamento ao espaço disponível. Este modelo de intervenção permite não apenas maior conforto, mas também maior adesão ao tratamento.
Além disso, o apoio domiciliário permite integrar a família e os cuidadores informais no processo terapêutico, ensinando exercícios simples e estratégias posturais para o dia a dia.
Condições mais comuns tratadas pela fisioterapia geriátrica
Os fisioterapeutas especializados em geriatria intervêm numa vasta gama de situações, tanto no contexto hospitalar como no comunitário. Entre as mais frequentes destacam-se:
- Doenças osteoarticulares, como artroses, artrites e lombalgias.
- Acidentes vasculares cerebrais (AVC) e outras patologias neurológicas.
- Doença de Parkinson e esclerose múltipla.
- Reabilitação respiratória em doentes com DPOC ou bronquite crónica.
- Síndromes de imobilidade e perda de massa muscular (sarcopenia).
Cada plano é desenhado de forma personalizada, respeitando o ritmo, os limites e os objetivos de cada pessoa.
A importância da reabilitação após hospitalização
Depois de uma cirurgia, uma infeção respiratória ou um AVC, o idoso enfrenta muitas vezes um período de fragilidade. Nesses casos, a fisioterapia é essencial para recuperar a funcionalidade e evitar complicações como úlceras de pressão, rigidez articular ou perda de equilíbrio.
Os fisioterapeutas hospitalares colaboram frequentemente com equipas multidisciplinares médicos, enfermeiros, terapeutas ocupacionais e assistentes sociais para garantir uma recuperação segura e integrada.
No regresso a casa, a continuidade dos cuidados é fundamental. Programas de reabilitação comunitária promovidos por entidades como as Unidades de Cuidados Continuados Integrados (UCCI) ou pela Santa Casa da Misericórdia têm desempenhado um papel essencial neste processo.
Benefícios físicos e emocionais
Os ganhos da fisioterapia vão muito além da força e da mobilidade. Envolvem também o bem-estar emocional, a autoestima e o sentimento de pertença.
O movimento liberta endorfinas, melhora o sono e reduz sintomas de depressão um problema silencioso, mas crescente, entre os idosos portugueses.
“A fisioterapia é uma forma de devolver ao idoso o controlo sobre o próprio corpo e a confiança para enfrentar o dia a dia”, explica Maria João Lopes, fisioterapeuta geriátrica no SNS.
Além disso, sessões em grupo, realizadas em lares ou centros de convívio, têm um impacto social positivo, combatendo a solidão e o isolamento.
Desafios do acesso à fisioterapia em Portugal
Apesar dos claros benefícios, o acesso à fisioterapia continua desigual. Muitos idosos dependem exclusivamente do Serviço Nacional de Saúde (SNS), onde os tempos de espera podem ser longos.
Embora o Plano Nacional de Saúde para as Pessoas Idosas (PNSPI) reconheça a importância da fisioterapia, a realidade mostra uma falta de recursos humanos e de cobertura territorial, sobretudo em zonas rurais.
Em alternativa, alguns municípios e instituições particulares de solidariedade social (IPSS) têm desenvolvido projetos comunitários que disponibilizam fisioterapia gratuita ou a preços reduzidos, em parceria com universidades e centros de saúde locais.
Exemplo disso é o Programa de Envelhecimento Ativo da Câmara Municipal de Lisboa, que inclui aulas de ginástica adaptada e sessões de fisioterapia preventiva em bairros sociais.
Tecnologia e fisioterapia: o futuro já começou
A digitalização também chegou à reabilitação. Hoje, existem plataformas de telefisioterapia, que permitem aos idosos realizar exercícios supervisionados à distância, com recurso a vídeo e sensores de movimento.
Em paralelo, exergames (jogos com movimento) e robôs de reabilitação começam a ser usados em clínicas portuguesas, combinando tecnologia e motivação.
Estas soluções, embora ainda pouco acessíveis, têm mostrado resultados promissores na adesão e na eficácia dos tratamentos, sobretudo entre idosos mais autónomos.
Como escolher o fisioterapeuta certo
Escolher um bom profissional é essencial para garantir resultados seguros. O fisioterapeuta deve estar inscrito na Ordem dos Fisioterapeutas, possuir experiência em geriatria e adaptar o plano terapêutico à condição física e cognitiva do idoso.
Antes de iniciar o tratamento, é importante fazer uma avaliação global incluindo equilíbrio, marcha, força, flexibilidade e nível de dor para estabelecer objetivos realistas e mensuráveis.
O cuidador informal tem aqui um papel central: deve acompanhar as sessões, aprender técnicas de mobilização seguras e reforçar a importância da continuidade dos exercícios em casa.
Reflexão final: envelhecer com movimento é envelhecer com dignidade
Envelhecer não é sinónimo de parar. A fisioterapia devolve aos idosos aquilo que o tempo lhes retira: autonomia, equilíbrio e confiança.
Investir em fisioterapia na terceira idade é investir em saúde pública, em bem-estar familiar e em dignidade humana.
Numa sociedade que envelhece rapidamente, cabe-nos profissionais, cuidadores e decisores garantir que ninguém envelhece sem apoio, sem movimento e sem esperança.






